quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

A CAVERNA DE CORDOVIL

Estive de férias alguns dias atrás e resolvi andar por aí, pelas ruas de minha cidade. Fiz pedaladas e andanças etílicas e conheci lugares interessantes.

Dia desses resolvi pegar o trem na central do Brasil e escolher uma estação para descer. Peguei o ramal Central-Vila Inhomirim, e chegando na oitava estação, que era Cordovil, larguei o trem. Andei uns três quarteirões fazendo o reconhecimento local, até que fui parar na rua Aragão Gesteira, uma rua com um campo de terra onde uma pelada rolava solta. Embora nublado, fazia um calor infernal, e logicamente que já estava pensando numa gelada. Gostei do pedaço por causa do campinho e fui catar uma bar nas proximidades. Olhei um de esquina que não me agradou, parecia uma padaria, e um pouco depois, na mesma calçada, vi um pessoal encostado numa porta fazendo um fuzuê danado. Ao entrar pela porta, meus caros, me dei conta que estava numa caverna em forma de birosca! Pensei comigo: - É aqui!!!

Uma imensa bandeira do Botafogo sobre o balcão e inúmeros pôsters do alvinegro colados na parede denunciam o time do coração de Seu Osmar, o dono da caverna. A clientela, de alta estirpe, falava de futebol e o sacaneava, pois na época o fogão ainda estava quase rebaixado. Os urros que vinham de dentro do boteco ecoavam do lado de fora chamando a atenção dos transeuntes. Eu, que entrei e pedi uma Brahma, que veio mofada, estava com a camisa do America. No primeiro instante tentaram zombar de mim por torcer pelo time tijucano, mas logo voltaram as atenções para o Osmar novamente. Coitado. Mas o homem não estava nem aí, e com um esgar sereno levava tudo na brincadeira.

Atrás dele, no altar da caverna, incontáveis garrafas de cachaça 51 estavam postas nas prateleiras. E como se bebe pinga no local, vixe Maria. Derrubei algumas Brahmas jogando conversa fora com o pessoal e nem percebi que já estava há umas três horas lá dentro. Quando anunciei que iria embora, o Rato, o grandão de casaco vermelho da foto, pediu para que esperasse cinco minutos, pois sua mulher estava trazendo uma comida. Pedi a saideira, e em pouco tempo entra a senhora do caboclo com uma bandeja enorme de empadão de galinha, que comemos até encher o bucho. É claro que solicitei mais líquido para o empadão descer.


Foi uma tarde bem agradável, e mais uma vez com pessoas que nunca havia visto antes. Isso prova que o botequim é o lar dos bons, o hospital das almas, o porto seguro dos desamparados, o exterminador de inimizades.

Até.

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

CRISE BELGA NA RUA DO ROSÁRIO

Como podem ver, a coisa anda muito lenta por aqui, e deve continuar assim por algum tempo.

Hoje resolvi aparecer rapidamente para mostrar uma imagem realmente impressionante. Durante plena crise belga no querido bar Alfarabi do meu amigo Carlinhos, pude captar este momento de meditação entre os três mosqueteiros da rua do Rosário. O bar já estava fechado, e cervejas belgas, alemãs, escocesas e argentinas eram derrubadas sem dó enquanto se falava de política, amizade, futebol, música e cerveja. A cada gole era um suspiro. Pelas caixas de som se ouvia o que há de melhor do nosso samba, como Luis Carlos da Vila e o partideiro Aniceto, e muita música cubana.


Pensativos ao som de Bola de Nieve.


Carlinhos
, Simas, Alvinho Marechal e eu fizemos uma festa, estávamos em estado de graça trancafiados em plena noite de sábado na rua do Rosário.

Quando Ibrahim Ferrer soltou sua voz em Perfídia o Marecha não resistiu e començou a dançar como criança acompanhado pelo Carlos Alves.




Beber com amigos é uma das coisas mais importantes do mundo. Felizes são os homens que têm mulheres que entendem isso.

Vida longa ao Alfarabi.

Até.

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

MODA DE BOTEQUIM 3

A semana que entra promete ser bastante regada a líquido que passarinho não bebe. O calor se aproxima de forma violenta e as cervejas e chopps estão descendo mais fácil que água da montanha. Nossas mulheres têm que entender, é impossível deixar de marcar ponto num bar qualquer.

Foi o que fez neste fim de semana o seu Camargo. Enquanto se divertia num boteco tijucano, deliciava-se com sua dose de 51, Dreher e catuaba (vejam a bebida pousada na maquineta). Uma espécie de rabo-de-galo, mas que ele chama de susto no fígado.

Quero pedir a atenção de vocês para a bolsinha inseparável do velho boêmio da zona norte. O caboclo estava de sapato branco (lembrou-me o saudoso Jacinto Figueira Junior), bermuda de linho com um vinco impecável, camisa social branca, e a tal bolsinha. Deixou todos que estavam na birosca com uma inveja danada de sua portenta capanga.

Se alguém aparecer na novela das oito com algo parecido, já sabem que estão copiando a moda.




Boa semana.

Até.

segunda-feira, 7 de setembro de 2009

PEDALADA ETÍLICA

O fim de semana com direito a feriado da independência foi regado a cerveja, muita cerveja.

Já no sábado pela manhã comecei os trabalhos com meu amigo Fraguinha. Sempre damos nossa pedalada pela cidade fazendo paradas estratégicas. Marcamos bem cedo na Livraria Folha Seca, Praça XV, e iniciamos ali o passeio.

Pegamos a rua da Assembléia, passamos pela praça Tiradentes, entramos na Gomes Freire, e fizemos o primeiro pit-stop. No Armazém Senado derrubamos duas ampolas e meia porção de salaminho. Eram nove da manhã. Depois de meia hora dentro desta casa secular, Fraga sugeriu rápida parada no bar Paulistinha, que fica a dez pedaladas do Armazém. Fomos recebidos pelo Mauricio, que já foi dando trabalho para a chopeira. Vinte minutinhos bastaram para bebermos meia dúzia de chopps e uma porção de cebolinhas. Estava estupendo!








Partimos visivelmente satisfeitos, sem rumo. Mas num rompante, meu camarada berrou no meio da rua:

- Estou com vontade de comer empada!!!

Já estávamos com idéia de irmos à Praça Mauá, então lembrei-me de uma empada maravilhosa que como por lá, e respondi:

- Siga a Caloi 10!!!

Entramos na Avenida Passos, cruzamos a Presidente Vargas, dobramos à direita na rua Larga, depois à esquerda na rua do Acre, e finalmente chegamos ao destino na rua Sacadura Cabral. Larguei a bicicleta na calçada e fui faminto ao balcão. Fraguinha, que estava curioso, pousou os cotovelos rapidamente. O bar Rio Park tem uma das melhores empadas da cidade em minha opinião, talvez a melhor. Comemos de olhos fechados, degustando bem devagar. Brahma gelada foi pedida para acompanhar.

Essas pedaladas viciam!

Depois da Praça Mauá rumamos para a Tijuca, onde terminamos nosso pedal com um descanso na quitanda Abronhense. Amoendoim e cerveja foram postos no balcão da maior quitanda tijucana. Seu José nos atendeu com a gentileza de sempre.

Foi difícil sair dali.

* A nota triste do dia foi o falecimento da dona Alzira, dona do Armazém Matoso, mulher do seu Manuel. Conheça a senhora aqui.

Até.

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

SAUDADES DO EL FARO

Em 1966 o restaurante El Faro, situado no posto seis de Copacabana, abria suas portas. Para ser mais preciso, ficava na outrora badalada Avenida Atlântica nº 3806. Meu tio Celestino, o Espanhol, foi quem abriu a casa, e nela ficou até o apagar das luzes, em 2002. Meu pai era sócio, e trabalhou entre 1968 e 1974. E foi aonde, aos treze anos de idade e com muito orgulho, comecei minha vida laboral.

O restaurante era definitivamente o melhor no assunto frutos do mar. Quem era freguês da casa sabe do que falo, quem nunca pôde dar as caras perdeu. A paella gigantesca, recheada de camarões VG e lagosta, era o carro chefe. Em segundo lugar ficava a casquinha de siri, eleita, por uma década, a melhor do Rio. Calarames a la madrileña e Polvo ao molho vinagrete também eram bem requisitados. As caipirinhas eram feitas para que o freguês pedisse pelo menos cinco delas, e o chopp era um CHOPP, tanto o claro como o escuro.

Ao seu lado ficava outro grande restaurante, o Rio Jerez, e mais à esquerda a famosa galeria Alaska. A badalação corria solta nos anos sessenta e setenta por aquelas bandas, e a casa ficava cheia todos os dias. Gringos pra cacete e pessoas famosas faziam o ambiente do lugar. Carlos Lacerda, Agildo Ribeiro, Agnaldo Timóteo, Juca Chaves, Costinha, Alcione (parece que meu velho deu umas carimbadas na Marrom), Rogéria, Cássio Loredano, José Augusto... Esses são alguns dos famosos que sei que eram fregueses.

O show dos Leopardos e dos Dzi Croquetes abarrotavam aquele canto no posto seis de Copa, e muita gente queria ver a bicharada em ação no palco. Em 1973, o arretado jogador de futebol Almir Pernambuquinho morreu ali com um tiro no meio da cara, depois de se meter numa confusão com uns portugueses que caçoavam dos rapazolas artistas do Alaska. Almir tentou defendê-los dos lusos e se deu mal. Meu tio conta que foi um corre-corre danado, mas que no final se deu bem, pois todos que estavam no Rio-Jerez, bar aonde rolou o furdunço, foram pra o El Faro.

Outro caso que me lembro bem, foi do ano novo de 1996/1997, este bem mais recente. Por causa dos fogos de artifício da praia de Copacabana, o restaurante lotava de forma anormal. Estava trabalhando nesta época, e lembro-me que tínhamos que fazer um pequeno esquema especial para que não houvesse baderna. Mas nesse ano houve um pequeno desentendimento, sempre tem alguém para dar um jeito de bagunçar o coreto. Eram mais ou menos 19 horas, cedo, e as mesas já marcadas esperando a freguesia. Nesta hora entra um homem bem arrumado, alto, bem alto, e posando com um crachá da prefeitura. Sem perguntar e falar nada com ninguém, sentou-se na melhor mesa e retirou o papel que marcava a reserva. Meu tio, explicou-lhe a situação trezentas vezes, mas o cara apenas mostrava-lhe o crachá e dizia que a mesa era dele.

- Pessoas muito importantes sentarão aqui. Dizia o caboclo.

Dava pra ver que o cidadão era um 171 daqueles, e depois de muito insistir meu tio começou a falar num tom mais elevado. Uma pequena discussão se iniciou, e o "homem da prefeitura" empurrou o peito do velho Celestino com suas duas mãos. Meu tio levantou e quebrou-lhe o braço com a facilidade que se rompe um palito. Não deu nem tempo pra eu pegar a perna da Xuxa, um taco de "baseball" que ficava debaixo da caixa registradora. Menos um para encher o saco.

Outro conto, desta vez engraçado, foi quando o Agildo Ribeiro tomou uma carraspana de vodka com uísque, o famoso drink Elis Regina, e resolveu transformar o bar em teatro. Subiu na mesa, tirou quase toda a roupa, imitava viado toda hora (não sei se ao certo era imitação), mas deixou a clientela morrendo de rir. Saiu dali engatinhando, e voltou no dia seguinte como se nada tivesse acontecido.


Meu tio tirando um chopp na pressão.




Meu pai, o primeiro à esquerda, dentro do balcão, nos primórdios da casa.


Vi muita coisa durante meu tempo de El Faro. O que me orgulhava mais era de ver a cara de satisfação das pessoas ao provarem a comida. Depois que a galeria Alaska virou mais uma igreja daquelas que brotam em todas as esquinas, a redondeza nunca foi a mesma. Nos anos noventa Copacabana deixou de ser a badalação carioca, e o movimento foi caindo.

Mesmo com várias pedras no caminho, a casa somente arriou as portas em 2002, com a aposentadoria dos sócios.

Fica aqui a minha saudade do bar que foi minha casa, e que plantou-me na memória incontáveis momentos bacanas.

Até.

quinta-feira, 27 de agosto de 2009

MODA DE BOTEQUIM 2

Há algum tempo passou por aqui um senhor com um estilo invejável, flagrado num bar tijucano. Hoje, repetindo a dose, vos trago a imagem de outro homem que deixará muito estilista de queixo caído.

No meu café de todas as manhãs na padaria/botequim Divino Trigo, seu Ari, o maior botafoguense do pedaço, desfilava com seu imponente pisante combinando com a meia "Adidas Sport". Tal exuberância era admirada pelos fregueses da casa enquanto o espirituoso senhor devorava seu sanduíche de linguiça com uma média caprichada.



Até.

terça-feira, 4 de agosto de 2009

BAR SÃO SEBASTIÃO

Fora da cidade neste fim de semana com a patroa, estive no sábado em Araruama e domingo em Petrópolis, tudo em prol de programas familiares e descanso. Sábado fui participar de uma festa na hora do almoço, e depois tive o da livre para meus passeios. Foi bem proveitoso.

Araruama tem pouco mais de cem mil habitantes e é marcada pela bela lagoa do Juturnaíba. Como toda cidade pequena, há uma praça, igreja, e algum comércio. Como sou um bom observador, depois de minha andança para fazer o reconhecimento do local, pude concluir que os botecos são abundantes na cidade. Depois de um bom tempo caminhando resolvi ancorar-me num bar para molhar o bico.

O pé-sujo escolhido talvez seja o menor de Araruama, ou até mesmo da região dos lagos, mas é grande quando se trata de cerveja gelada. Localizado defronte a bela igreja de São Sebastião, construída em 1867, o bar São Sebastião é o tradicional bunda-de-fora. É pequeno demais, uma portinha de entrada, e um balcão que acomoda apenas um cotovelo. Mas o boteco é tão aconchegante que o pessoal improvisa na acomodação. Duas mesas ficam do lado de fora, somente duas, e dentro o jeito é sentar em engradados ou fazer do "freezer" horizontal uma espécie de balcão. Lá dentro, sentadinho atrás das estufas que guardavam ovos cozidos, sempre eles, e os clássicos sanduiches de bife à milanesa com uma folha de alface, estava o Seu Carlos, comandante do pedaço.

Fiquei numa dessas mesas do lado de fora, pois no interior a lotação já alcançara o seu limite. Pedia minhas cervejas vagarosamente, sem medo do tempo, e aproveitando a brisa que resolveu dar a graça. Na verdade, quase dormi por causa disso. Na mesa ao lado, um senhor na casa dos oitenta, bebia sua gelada enquanto brincava com as moças que passavam pela calçada. Demos início a uma agradável prosa (uma das coisas que o bar nos permite fazer, mesmo com pessoas que veremos somente naquele instante), que findou-se horas depois. Dava gosto escutar os contos do Seu Laerte. Travessuras na Lapa - volta e meia falava com ar de saudade: A Lapa era minha... - namoricos na Praça Mauá e em Madureira, onde morava. Perguntei-lhe pelo bairro suburbano e percebi a alegria em seus olhando quando tocamos no assunto. Falou principalmente de samba, de sua portela, da criação do Império Serrano e dos anos em que disputava o samba-enredo pela azul e branco.

Mais uma vez, pessoal, salve nosso bar do dia-a-dia e nossa cultura botequinesca. Salve o povo brasileiro e seus costumes.








Seu Laerte

Até.

segunda-feira, 27 de julho de 2009

DIVINO TRIGO

A rua de Santana, na Cidade Nova, é conhecida como o império das lojas de equipamentos para restaurantes. São coifas, máquinas de café, fogões industriais, chapas, liquidificadores industriais, suqueiras, e por aí vai. Além disso tem um correio, uma agência bancária, uma lavanderia, um chaveiro e um estacionamento. E bares? Bares, para ser mais específico, botecos, não tem. Existem dois pequenos restaurantes, que dão de comer ao povo que trabalha por perto, mas para beber fica difícil.

A única salvação da rua é a padaria Divino Trigo, comandada pelo Adelino pai e Adelino filho, este último é mais conhecido como Frank. A casa abre às cinco e meia da manhã, e fecha às vinte e três horas. Quem der as caras no local certamente será bem atendido pelos empregados Daniel, China, Calixto e Manel, que comandam o balcão com maestria. A eficácia, o sorriso e a galhofa, fazem parte do atendimento deste time.

A padaria fabrica produtos diversos, que estão sempre frescos. Até a extinta bisnaga ainda é feita por lá. Bom, isso tudo é previsível quando falamos de uma padaria, mas o atrativo principal é outro, a cerveja. Sempre de trincar os dentes, as garrafas começam a habitar o balcão só no início da noite, quando o cafezinho deixa de reinar. Para acompanhar a bebida, pede-se geralmente uma porção de salaminho, que vem muito farta, tem também o tradicional ovo cozido, azeitona, e outros acepipes mais. Meu predileto é o ovo frito com gema mole para molhar com pão.

Segue a recomendação para quem estiver passando por estas bandas. Vale a pena dar uma entrada pedir uma cerveja gelada.











Até.

quarta-feira, 1 de julho de 2009

GLORIOSA NOITE NA GLÓRIA

Semana passada consegui um raro momento para beber cerveja. Um amigo meu aqui do trabalho, o Baiano, disse-me que seu tio estava de férias no Rio e procurava alguns bares sujos para beber.

Como ele zanzava pelo centro, saímos da labuta e fomos ao seu encontro. Baiano disse-me que o coroa gostava mesmo é de pé-sujo, então foi para onde o levamos. Primeiro levei-lhe no bar do seu Davi, glorioso botequim que impera na esquina de rua do Senado com Inválidos, onde terças e quintas cantam seu Jorge e seu Waldir. Vejam aqui e aqui.

Caminhamos por outros bares conhecidos, e andamos um bocado sem nos dar conta. Confesso que fazia um passeio para agradar o caboclo, e em certos momentos parecia turismo. Passamos rapidamente pelos arcos, e acabamos dando de cara com o Beco do Rato, que ele ouvira falar e queria conhecer. Teve tempo apenas de dar uma golfada diante do lixo que encontrou, com gente esquisita e "underground", e suplicou por um outro boteco.

Como o Chico, este é nome dele, ficou tão nervoso com o que viu, pediu um bar com urgência. A primeira coisa que pensei foi tirá-lo do infeliz burburinho daquele lugar, e o levei em direção a Gloria. Fomos, por sorte divina, parar diante de uma das mais antigas casas de saliência da cidade, a termas Rio Antigo. Perguntou-me se era um hotel, pois achou a arquitetura muito bonita e imponente, mas não precisou de muito tempo para notar que o ramo comercial ali era outro. Por causa de sua curiosidade exagerada com o lugar, acabamos entrando no bar localizado exatamente defronte à casa das primas, na esquina de Joaquim Silva com Augusto Severo. Chamam o local de bar Glorioso, mas não vi nenhuma placa no mesmo.

O lugar era escuro, sujo e escroto. Eu, que devo ser o cara que mais adoro estes balcões radicais, cheguei a torcer o nariz quando entrei. Mas é o que falo sempre, foi só começar a pedir as bebidas e comidas para ter a certeza de como sou feliz quando piso nos meus botecos. A cerveja chegou na minha frente fumegando mais do que a bomba atômica, de rachar os dentes. Os ovos que pedimos estavam fresquinhos, saudáveis, bons para caralho. E arrematamos com uma porção de fígado acebolado que nem minha vó faz igual. Nesta altura do campeonato o Chico já bradava na calçada atacando o tal do beco do rato com xingamentos que não posso escrever aqui. Delirava naquele canto imundo, doido para entrar no tal "hotel" e ver as meninas.






Os atendentes do pé-sujo eram mudos, somente colocavam os pedidos diante de nós. Anônimos diversos tentavam a sorte na jogatina. Do lado de fora, além de nós estava um coroão que mais parecia um desenho animado. O cara tinha uma juba estilo "black", daquelas que o João Saldanha reprovaria na certa, e estava mais imundo do que a cozinha do Belmonte. Trata-se de um mecânico da área, que vive por ali no intuito de ver as damas entrando e saindo do trabalho no "hotel". O cara é um negão de cabelo branco, e seu nome é Xavante. É complicado pessoal, mas é isso.

O cidadão estava meio na dele, fumando seu cigarrinho, mas depois de umas doses de São João da Barra e copos de cerveja já dançava Maicou Jéquison na calçada, para o aplauso dos que passavam e estavam ali. Convidou-nos para um churrasco que faz toda a semana, e disse que já comeu todo mundo dentro do "hotel", afirmando já ter até perdido a graça entrar ali. Foi um furdunço geral.







Eu sei o seguinte... A pouquíssimos metros dali, no calçadão da Glória, outras meninas desfilam pomposas e posudas, guardando no interior de suas vestes minúsculas dotes um pouco diferentes. Espero que nosso dançarino "black power' não tenha confundido o cardápio.

Salve o bar, salve o bar!

quarta-feira, 27 de maio de 2009

UMA TARDE EM MARECHAL HERMES

Estive no último domingo em Marechal Hermes. Um amigo meu que mora no bairro vive me falando do Bar do seu Zé, e jura que é reduto de torcedores do América. Tive que conferir. Peguei o trem na Central do Brasil, e em 25 minutos estava na estação de Marechal, que na minha opinião é a mais bonita de todas. Entrei na rua Cabrália, e em poucos instantes já pousava meu cotovelo no balcão.

Cada vez que vou para o subúrbio tenho a certeza de que terei um grande dia. As pessoas são acolhedoras demais, te levam pra dentro de suas casas, contam suas intimidades como se você fosse um irmão... Fazem a vida valer a pena sem dinheiro, sem "olho grande", sem ganância. Uma tarde bonita com os amigos no bar não tem preço, e é uma das poucas coisas que levamos de bom nessa vida. Esse é o pensamento do suburbano, do tijucano, do morador da zona norte. Difícil alguém fugir da regra, até porque não faz sentido se descabelar por dinheiro, pois caixão não tem gaveta.

Fui apresentado aos senhores do local, que com muita elegância me receberam. Barrigas enormes à mostra, pés, que mais pareciam cascos, na sua maioria pisavam descalços no chão sofrido, arrotos eram distribuídos com abundância, e juntamente com gargalhadas altíssimas formavam a orquestra da casa.

Um homem que bebia sua cerveja na caneca do América chamou-me a atenção. Puxei uma prosa, que cinco minutos depois virou festa. Sentei-me à mesa com Gilmar, este é o nome do caboclo, que começou a cantar o hino rubro de forma doentia, aos brados. Mostrou-me sua carteirinha de sócio remido e outra carteira de fundador da torcida inferno rubro. Derrubamos umas geladas com a companhia de Givaldo, seu amigo botafoguense, e seu cunhado Geraldo. O churrasquinho comia solto na porta do boteco, e em certa hora percebi que já fazia parte do local. O subúrbio é assim mesmo.

Gilmar pediu licença para se ausentar um instante, saiu do bar, entrou num opala marrom, e partiu. Em quinze minutos estava de volta, com um largo sorriso na cara e uma sacola na mão. Aproximou-se de mim e disse:

- Toma. É o "kit" do América.

Agradeci, muito surpreso, enquanto tirava as coisas de dentro da sacola. Era um cd, uma bandeira, um calendário e uma camisa da Inferno Rubro. Imaginem como foi depois... Uma cervejada daquelas.

O bar do seu Zé é alegre, definitivamente não é um reduto para os boêmios que querem curtir uma fossa. Tem uns petiscos de saquinho, como azeitona e tremoços, e alguns frios. Bebida é o forte da casa, tem até água-raz.

Fiquei até o filho do seu Zé fechar as portas, e fui convidado para um evento chamado chapéu de palha, que vai acontecer no próximo sábado. Trata-se de um samba feito pela velha-guarda local dentro do bar. Toda a coroada, logicamente, usando seus chapéus, unidos mais um dia. Deve ser muito bacana, emocionante.

Fica aqui a dica.



Chegando em Marechal...



Prateleira com escudo rubro...


Os senhores do local...



...vivem a amizade no balcão.



A moda.



O São Jorge do bar.



Gilmar com a caneca de sua paixão...



Com a carteirinha...



E depois de me entregar alguns regalos.



Hora de ir embora.



Esperar o trem e ir pra casa feliz.



Até.

segunda-feira, 6 de abril de 2009

E O GAÚCHO VOLTOU O MESMO

Há dois meses o Bar Gaúcho, que fica na esquina da Rua São José com Rodrigo Silva, fechou as portas para reforma. Coloquei aqui minha preocupação com a mesma, já que na maioria das vezes os bares voltam estragados depois de obras.

Na última sexta-feira soube pelo meu amigo Edu que o bar acabara de reabrir. Resolvemos então, no fim da tarde, nos encontrarmos por lá para conferir. Juntaram-se a nós o Leo Boechat, Hans e Zé Sergio. E posso afirmar que tive uma boa surpresa. O bar voltou como sempre, com os azulejos cafonas, com a antiga máquina de café Capital, e com a estufa cheia de empadas e linguiça.

O boteco estava completamente lotado, e lá pelas tantas caiu água pra cacete, fazendo com que parte da freguesia invadisse a Óticas do Povo para continuar bebendo sem pegar chuva.





















A conclusão é essa, meus caros, o Gaúcho continua como sempre, e voltou com a corda toda.

segunda-feira, 30 de março de 2009

BAR DO SEU LUIZ

Resolvi escolher um boteco, nunca antes pisado por mim, para beber na sexta-feira passada após o final de mais uma semana de batente. Optei por um que fica na rua Tadeu Kosciusko, no Bairro de Fátima, já que vou bastante por aquelas bandas e sempre namorava de longe este bar.

Logo que entrei parei num cantinho do balcão e pedi minha gelada. Três homens sozinhos bebiam dentro do local também, e mais uns cinco do lado de fora. O bar é minúsculo, por isso muita gente se acomoda na calçada mesmo, de pé, pois não há mesas. O seu Luiz, dono do estabelecimento, percebeu que eu olhava para as bebidas quentes da estante e foi logo me oferecendo a especialidade da casa, a cachaça Catarina. Desce rasgando um pouco, mas logo logo dá um jeito de acalmar nosso corpo. Muito boa. Na estufa, duas travessas de dar água na boca estavam à mostra, uma de galinha ensopada com batatas e outra de carne assada com batatas.

Não posso deixar de lembrar, que das caixas de som engorduradas de um rádio safado, saíam músicas da jovem guarda, somente da jovem guarda. Golden Boys, Renato e seus Blue Caps, Os Vips, Os incríveis, Pholhas, Wanderley Cardoso... Era uma atrás da outra. A clientela curtia as músicas a seu modo, e poucos eram os entusiasmados. Seu João, um senhor negro que estava num banquinho ao meu lado, era o que ariscava o nome das canções tentando se entrosar com a rapaziada. O resto do povo estava pensativo, com semblante preocupado e triste. Curtiam o som apenas com o mexer dos pés ou das mãos para acompanhar o ritmo.


Lá pela minha terceira garrafa de cerveja, cheguei a conclusão de que não estava num botequim, e sim numa espécie de hospital das almas. Vi claramente que os homens que ali bebiam tinham algum tipo de problema que os incomodava, por isso as caras lúgubres, as feições lastimosas. O Bar do seu Luiz é o que recanto perfeito para quem necessita se recolher com seus pensamentos em busca de alguma solução. O Bar do seu Luiz é a mais tranquila das casas para estes cidadãos, dando inveja até mesmo a igreja da esquina, já que a esmola que deveria ir para a sacolinha estava ficando no caixa do bar. Os verdadeiros fiéis necessitados de ajuda estavam ali, recebendo afeto, carinho, e cachaça de um pé-sujo. Esta é a verdadeira instituição do povo, onde se pode depositar todas as lamúrias sem receber loucas penitências.

Teve um coroa preto de bigode (parecia o Assis do Fluminense) que chegou lânguido, não conseguiu nem tirar a bolsa das costas. Lá pela quarta garrafa, quando parecia que iria morrer à beira do balcão, seu João, o coroa que estava atento no som, falou:

- Ei! Ô Bigode! Presta atenção na música... Quem canta essa? Hein? Hein?

E cantava na intenção de que o pobre ébrio melhorasse a cara...

- Co-nhe-ci um capeta em forma de guri. Co-nhe-ci um capeta em forma de guri... São os Incriveis! Dancei muito isso ali em Rocha Miranda.

Pela primeira vez eu vi os dentes do crioulo bigodudo, que bebeu mais uma, e partiu. Os outros fregueses estavam como ele no bar, e sei que depois de doses de companheirsmo no botequim voltaram para suas casas um pouco menos tristes, dando uma folga para os problemas cotidianos e deixando os devaneios em primeiro plano.

Viva o bar, a sucursal do nosso lar.



Fartura.



Comida honesta.



Especialidade da casa.



Mais fartura.



Seria a pintura do Nilton Bravo?



O bigodudo estilo Assis...



...estava pensativo, mas saiu mais feliz.



Seu João, o que animava a rapaziada.



Outro que estava só.



Mais um fiel de balcão.


Até.