quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

PAPAI NOEL LUSITANO NA RUA DO MATOSO

Dia 24 de dezembro de 2012. Véspera de natal e ao mesmo tempo um dia como outro qualquer para os frequentadores dos bares da região. Começo de tarde, eu e mais dois amigos, Léo e Edu, convidamos o Albanês, marido de minha mãe, para mais uma resenha cotidiana no baixo Matoso, já pelas bandas da Praça da Bandeira. Tínhamos fome e por isso o bar escolhido foi o Galeto Rex, que na minha opinião é o melhor. Somos locais no pedaço, portanto logo nos arrumaram mesa e cadeiras, e sem que pedíssemos veio a cerveja. O papo estava legal, ritmo de fim de ano e época em que as preocupações são jogadas para debaixo do tapete. Comemos com vontade a farta comida, o que nos fez calar a boca por alguns instantes. Recolhidos os pratos, as atenções se voltaram novamente apenas para a cerveja, que agora tinha como coadjuvante a generosa dose de Underberg servida no local (nacional, diga-se de passagem). Estávamos bem acomodados, veio até aquela preguiça boa pós almoço. Muito agradável.

Nossa tranquilidade foi interrompida no momento em que um dos cidadãos que estava na calçada do bar ao lado começou a gritar:

- Olha o Papai Noel!!!! É o Papai Noel!!!

Eis que entra na rua do Matoso um Escort azul todo remendado, com alto-falante externo que tocava no último volume os hinos dos clubes cariocas. Estavam coladas no alto-falante, bandeirinhas do Brasil, uma foto de um leão e outra de dois tucanos (?!). Quem dirigia o possante? Era mesmo o Papai-Noel, que estava com sua roupa completa e óculos escuros. O bom velhinho estacionou o "trenó" diante do bar Matosinho (farei em breve a resenha deste bar espetacular) para delírio dos fregueses e mendigos locais. Ao sair de seu veículo, cumprimentou alguns populares e caminhou em direção ao Rex, onde estávamos, seguido pela comitiva de curiosos. Sentou-se no banquinho, pôs o cotovelo direito no balcão e usou a mão esquerda para educadamente chamar o garçom e pedir:

- Uma Brahma gelada e uma galinha, por favor.

Neste momento tivemos a certeza que tratava-se de um Papai-Noel diferente, não por estar comendo galinha e bebendo Brahma, mas por não ser originário do Pólo Norte. Ele falava português, mas com sotaque lusitano!

Albanês correu para brindar com o Papai Noel.


Ficamos curiosos e deixamos ele comer em paz para depois fazermos a aproximação. Eis que, quando ainda estávamos perplexos com a presença de nosso ídolo de tempos de criança, surge, como se nós três estivéssemos sonhando, Milton Nascimento. O músico parecia à vontade, falou com a gente, deu um abraço apertado no Léo e pediu costela com aipim. Falou com o Papai-Noel e dividiu o balcão com ele, disse aos atendentes que já o conhecia há tempos, dos "bailes da vida". Foi um momento único, tenho certeza que nunca vou esquecer deste dia. Emoção ao quadrado, bem na Praça da Bandeira.


  Milton e Papai Noel ao fundo conferindo o saco.

Noel acabou de comer (comeu a galinha sem tirar as luvas brancas), palitou os dentes, deu uma conferida no saco e foi falar com a gente. Era de Portugal mesmo, de Braga, e tinha 73 anos. Velho simpático, falou da dureza de seu trabalho e da jornada que iria ter pela frente naquele dia. Comentou ainda que sempre que podia passava por ali para comer no Rex, que para ele também é o melhor galeto do mundo. Ficou encantado com meu fusca 67, e com toda a educação pediu para sentar no banco do motorista. Disse também que seria um belo trenó, foi um orgulho pra mim. Antes de partir para cumprir sua missão, tirou foto com povo, aumentando mais ainda o clima natalino na região.


 Papai Noel palitando os dentes após almoçar.

     Ele no fusca. Emoção...

   Com os populares.


Milton continuou no bar, ao acabar de comer cantarolou "Travessia" e disse a todos que a energia daquela esquina era muito positiva, o fazia lembrar de velhos tempos.

Foi, meus caros, um dia muito feliz.

Até.

*** As duas últimas fotos são de meu amigo Leo Boechat.

sábado, 19 de janeiro de 2013

DE VOLTA, E COM O ARMAZÉM.

Voltando hoje depois de um tempo parado. Muita coisa aconteceu neste período de inatividade, mas o que importa é que a casa está reaberta. Tenho visitado alguns bares que já conheço e sou freguês há anos, como   lugares importantes no cenário pé-sujo carioca que ainda não havia tido o prazer de pisar. Vamos com calma, aos poucos entramos em velocidade cruzeiro citando estes locais e dividindo com todos as belas experiências etílicas de nossa cidade

Dia desses, poucos atrás, retornei ao Armazém Senado, local que já mencionei aqui e aqui. Meu irmão Arthur Favela, paulista, toda vez que vem ao Rio pede para irmos lá, e como ele pintou por aqui junto com o Danilo, outro chapa, fomos num sábado bem cedo. O bar, ainda bem, continua a mesma coisa, diria até que mais bacana. Falo isso porque vivemos uma onda de modernização que não tá no gibi, e quem perde com isso é a freguesia. Não posso negar que ainda estou muito preocupado com a absurda construção dos espigões da Petrobrás ali na Senado com Inválidos. O bar do Seu Davi foi pro saco, a igreja de Santo Antônio dos Pobres tá interditada com rachaduras e meio quarteirão de casarios históricos foi demolido. O Armazém Senado resiste, destoa do que está acontecendo ali, e isso graças aos donos. Foi recentemente tombado pelo alcaide, o que não deixa de ser uma boa notícia, se bem que a cobertura do falecido estádio Maracanã também era tombado e... Há preocupação.










Bom, voltemos ao sábado pela manhã. Às 10 horas cheguei e prontamente abri os trabalhos. Estava biritando no balcão, aguardando Favela e Danilo, e um coroa passou com uma garrafa de cachaça chamada São Paulo. Fiquei mirando e ele então me ofereceu uma dose, pois a garrafa era dele, acabara de comprar no próprio Armazém. Foi uma grande descoberta, cachaça pernambucana, boa companheira para a cerveja. Resultou que não resisti e tive que levar uma pra casa também. Proseava com o senhor e logo chegaram os dois caboclos. Bebemos com vontade, para matar a saudade, e beliscamos salaminhos e azeitonas. Minha garrafa de São Paulo ficou pela metade, diga-se de passagem. 

O legal do Armazém é que ele tem fregueses muito fiéis, então você sempre conhece alguém, sendo assim a conversa que é de um acaba virando de todos.  Samba das antigas saía pelas caixas de som, o que nos deitava ainda mais no balcão de mármore de 105 anos. O que me deixa feliz cada vez que vou ao Armazém Senado é como o Fernando e Henrique cuidam da casa. Colocaram os vidros antigos cheio de detalhes, preservam o balcão histórico, têm vinhos da melhor qualidade na carta, cachaças de vários rótulos nas prateleiras, fotos antigas nas paredes... Tudo isso sob o olhar atento do Seu Antônio, pai dos dois, velha guarda e boa praça.








Com mais esta visita, posso afirmar tranquilamente que o Armazém Senado ainda é um lugar aonde se vive o Rio de Janeiro da forma mais bonita, onde o dia passa e não se percebe. Bebe-se como antigamente.

Até