terça-feira, 28 de outubro de 2008

BAR RAINHA DE SANTANA

É com certa frequência que vou ao Bar Rainha de Santana, mais conhecido como Bar do Marimbondo por causa da cachaça que leva este nome e é muito consumida no local. Esta birosca fica ao lado do meu trabalho, por isso a facilidade de minha presença. É o único bar que conheço que tem como carro chefe uma cerveja preta, a Black Princess, e que é o motivo de minhas idas quase diárias.

Quando chego dou "boa noite" para todos, mas com uma pitada a mais de carinho para a dupla da mesa da pilastra. Dizem que gostam mesmo é do balcão, mas suas pernas não concordam muito com a idéia. Amilcar e Dirceu são amigos há setenta anos, eu disse SETENTA, e bebem juntos há mais de meio século. Nasceram em casas vizinhas na rua do Riachuelo, brincaram na mesma calçada, e estão aí até hoje. Acho que posso dizer que são irmãos.

Neste pé-sujo o que há é boa gente. Bebe-se no balcão, nas mesas, ou na calçada. E o Severino toca o botequim com muito gosto, provocando o paladar da clientela com jóias de sua apurada culinária. Os restaurantes de comida à quilo que fazem a concorrência não preocupam este cearence arretado. São vários os acepipes, e os tabuleiros de batata calabresa da casa saem três vezes por dia da cozinha por causa da grande procura.

Seu Amilcar e seu Dirceu degustam as iguarias diariamente enquanto relembram os momentos do passado, e vivem assim um belo cotidiano de amizade regado a cerveja e botequim. Que esta amizade dure por muito anos, deixando assim o bar do Severino com um pouco mais de nobreza. A amizade desta dupla de senhores só podia ser alimentada num boteco, que coisa bonita.



Seu Amilcar e seu Dirceu.















Até.

domingo, 19 de outubro de 2008

TIRO O CHAPÉU

Em 1880, quando Thomas Edison acabara inventar a lâmpada, o avô do Seu Almir abria as portas da Chapelaria Porto. A mais antiga chapelaria do Rio de Janeiro, e talvez do Brasil, fica no bairro da Saúde. As antigas escadas de madeira do casarão nos levam ao sobrado, e a cada degrau vencido temos a impressão de que estamos entrando numa espécie de túnel do tempo. Neste sobrado secular trabalha este homem que já perdeu há muito tempo a luta contra os cabelos brancos. É o incansável Seu Almir, neto do falecido seu Honório, que fundou esta jóia há 128 anos.

Ele conta que seu pai foi chapeleiro de quase toda a boemia carioca nos anos 30 e 40, e também já vez muita cartola pra gente importante usar nas festas da Confeitaria Colombo.

Além de vender chapéus, ele os fabrica, e de forma artesanal. Coisa rara neste nosso mundo de andróides. A especialidade são os Panamá, mas encontramos de vários modelos.

O orgulho de comandar tal negócio é facilmente percebido no olhar e no entusiasmo deste velho homem ao falar de suas mercadorias. Gosta de explicar tudo, mostrar todos os detalhes. Basta uma rápida passada de olhos na cabeça do cliente que ele afirma:

- Chapéu pra você tem que ser número 58, pode experimentar.

Não dá outra.

E se mesmo assim o cliente achar que está um pouco apertado não há problemas, é só colocar o chapéu no "moderno" alargador manual do século XIX, herança do vovô Honório. Seu Almir herdou ainda, a máquina de costurar Singer com seu devido móvel - que está em pleno funcionamento -, e os moldes de madeira para fazer os chapéus, que estão com mais de cem anos também.



O orgulhoso Seu Almir.



Um dos moldes de madeira.



O alargador de chapéus.



A máquina Singer.



O detalhe do móvel Singer.















O cartão da casa foi desenhado pelo Seu Honório no tempo do onça.


E ele vai tocando a vida assim, num bairro na Zona Portuária, teimando, resistindo, debochando da modernidade com produtos de alta qualidade feitos por suas mãos, e com a ajudinha de suas ferramentas praticamente extintas no mundo.

É realmente muito bonito e emocionante visitar este local.

Vale lembrar também que o filho do seu Almir divide a labuta com ele na intenção de perpetuar esta maravilha.

Nos resta apenas desejar longa vida à Chapelaria Porto!

Até.

segunda-feira, 6 de outubro de 2008

MÚSICA DE BAR 2

No fim do mês passado lhes mostrei aqui um vídeo do seu Waldir. Pois é, na mesma noite, após a apresentação do seu Waldir, entrou em cena o seu Jorge. Os dois cantam sempre às terças e quintas em um bar no Centro, o qual não falarei o nome. Nesta semana estarei prestigiando estes dois homens novamente.

Seu Jorge está com 72 anos, tem um gogó de ouro, e canta Nelson Gonçalves, Orlando Silva, e alguns boleros. Seu repertório é isso. Todos os moribundos que populam o lugar esperam ansiosos pela entrada triunfal do seu Jorge, que antes de soltar a voz agradece no microfone:

- Muito obrigado, sem vocês não seria possível esta apresentação.

Logo depois dá uma piscadinha para o Ribamar, que comanda a guitarra, e a canção se inicia.

Seu Jorge mora no local onde trabalha, na rua da Alfândega. É funcionário de uma dessas lojas de tecidos comandada por um turco qualquer. Diz que ama viver ali, e não troca o "SAARA" por uma casa no sul da França.

É mais um homem brasileiro que faz história para poucos com extrema intensidade, no seu cantinho, com seu povo, vivendo feliz.





Sou um sortudo por poder acompanhá-lo.

Até.