quarta-feira, 10 de junho de 2020

ANDRAJÓPOLIS HOJE

Andrajópolis é uma cidade de quatro esquinas, um cruzamento de respeito. Como o nome já diz, a cidade dos andrajos. Matoso com Barão de Iguatemi. Alguns botecos imundos e figuras ímpares estão ali. Frequento esta cidade há muitos anos e posso afirmar que sou um cidadão andrajopolitano. Como estará o lugar hoje em dia, com esta covid maldita?


REX:
Primo rico do cruzamento. Faz entregas e vai bem obrigado. Melhor galinha do Brasil com ¨S¨.



Milton e Papai Noel já comeram a galinha do REX.

BAR DA BALA (GONZAGUINHA)

Lendário local localizado num lindo casarão que faz esquina com três ruas. Matoso, Iguatemi e Pereira de Almeida. Mario comanda. Portas arriadas atualmente, mas Mário sempre está com uma delas aberta pra ficar olhando o movimento da rua. Provável que alguém beba lá dentro no disfarce. Confesso que temo pelo futuro do local. Estou sempre na vigia.



Mário vê a tv de 14 polegadas.



Sr. George no sofrimento diário.

MONTE CARLOS:
Fica na Matoso, em frente ao Mundial. Depois da reforma não é mais o mesmo, tirou inclusive o orelhão que tinha lá dentro. Mas tem importância, serve café e cachaça para o pessoal do carreto no supermercado. Vai bem. Confesso que lambo ali ainda quando saio das compras.

GALINHEIRO:
Aviário Santa Rita. Fica na Matoso 38. Tá aberto como sempre. Vende galinhas, panos, vassouras, rodos, ovos, ração, carvão... Infelizmente não tem tido coelhos ultimamente. Amanhã vou lá.

BAR BONDE 33:
Esse eu tenho medo. Esses locais não fazem o tal ¨delivery¨. Já viu andrajo fazer pedido de comida? Nem casa têm. Fica na Barão de Iguatemi 46-D. Seu nome faz homenagem à linha 33, Praça da Bandeira - Lapa. Fazia o trajeto Praça da Bandeira - Rua Joaquim Palhares - Largo do Estácio - Rua do Estácio - Rua Salvador de Sá - Rua Frei Caneca - Av. Mem de Sá - Largo da Lapa. Vende orelha no feijão por 10 reais e alimenta com maestria o pessoal local. Não gosto nem de pensar no futuro.


Sem comentários.

TURF PARADISE:
Fica na Matoso 32-B. Reúne os maiores imundos da região. Tá aberto na moita mas não engana ninguém. É imprescindível para a cidade de Andrajópolis, pois faz parte da recreação do povo.

ALMARA:
Paulinho, ah Paulinho. Se você não reabrir eu morro. Tá fechado atualmente. Eu mordo as unhas só de pensar que um dia as portas podem não subir mais. Ferreira Gullar frequenta até hoje. O quadro do Snoopy sumiu de forma criminosa e imperdoável. É um local que segura a onda de muitos desiludidos.




Almara!

NINA:
Cachorra que morreu em 2012 mas era especial no lugar. João cuidava dela. DEP,



Nina com João no extinto bar Matosinho. Pegou fogo.

CRISPIM (SAMU):
Entidade máxima, prefeito dos andrajos. Andou sumido mas tá na área. Pede cigarro e cachaça com gestos como sempre. 



Crispim pedindo fogo em Almara.


Queria que o Brasil todo fosse Andrajópolis mas sei que é apenas um sonho, tudo é complexo hoje. Prefiro sonhar então.

terça-feira, 9 de junho de 2020

BOTEQUIM EM TEMPOS DE PANDEMIA

Última postagem foi em setembro de 2014. Nunca mais me atrevi a escrever algo aqui, apesar de meia dúzia de pessoas me lembrarem da existência deste espaço e pedirem para retornar. Quase ninguém lê blog nos dias de hoje, as coisas ficam cada vez mais rápidas e o instagram e tuíter são ferramentas mais dinâmicas. Talvez seja justamente o motivo que me atrevesse a voltar a escrever algo, pouca gente lerá. O Pileque, outrora Boemia e Nostalgia, foi um passatempo que documentou vários momentos meus em botequins e velhos cantos. Um pequeno baú de instantes em que vivi e vi a vida de outros em um local que amo, o pé-sujo. Fiquem à vontade para conferir as postagens anteriores. Em 2014 nem bar eu tinha, hoje comando o Bar Madrid desde 2015. Muita coisa mudou, mas meu amor pelos balcões calejados continua o mesmo, talvez maior.

Como é sofrida a vida em 2020 para quem ama um bar. Jamais poderíamos imaginar que uma pandemia fosse capaz de deixar vários biriteiros com tremedeira. Mas andando por aí pode-se ver várias pocilgas com aquela meia porta marota. Fazem barricadas com engradados para esconder os soldados armados com o copo, que quase sempre deixam suas perninhas à mostra quando você abaixa a cabeça para ver como está o movimento lá dentro. Triste, pois muito boêmio vai pro caixão nessa, todos espremidos se acotovelando no balcão, sem máscaras e compartilhando os perdigotos da morte. Muitos mesmo sabendo do perigo batem o pé e dizem que vão morrer felizes. O Brasil vive dias macabros e os problemas se acumulam, além do mais tem muita gente solitária que vai se enforcar se não sair pra rua. Mas o certo mesmo é ficar em casa.

Uma de minhas preocupações de hoje é a quantidade de bares que estão fechando em definitivo. Já sei de muitos e suspeito de outros. Os pequeninos, onde se bebe somente em pé e se escarra no chão, dão mais dó. Esses são uma espécie de SUS para muitas almas dilaceradas pelo mundo moderno que não deu certo. Onde irão se escorar essas pobres pessoas que fazem do balcão sua muleta? Onde terão um pouco de ilusão? Essa doença do capitalismo está colocando o humilde para pagar o pato. É como uma guerra. 

Pretendo neste retorno lembrar de velhos tempos e documentar o que está acontecendo hoje nestes "bunkers" que estão em extinção e abrigam busilhões que brincam com o perigo em dias doentes.