quarta-feira, 1 de julho de 2009

GLORIOSA NOITE NA GLÓRIA

Semana passada consegui um raro momento para beber cerveja. Um amigo meu aqui do trabalho, o Baiano, disse-me que seu tio estava de férias no Rio e procurava alguns bares sujos para beber.

Como ele zanzava pelo centro, saímos da labuta e fomos ao seu encontro. Baiano disse-me que o coroa gostava mesmo é de pé-sujo, então foi para onde o levamos. Primeiro levei-lhe no bar do seu Davi, glorioso botequim que impera na esquina de rua do Senado com Inválidos, onde terças e quintas cantam seu Jorge e seu Waldir. Vejam aqui e aqui.

Caminhamos por outros bares conhecidos, e andamos um bocado sem nos dar conta. Confesso que fazia um passeio para agradar o caboclo, e em certos momentos parecia turismo. Passamos rapidamente pelos arcos, e acabamos dando de cara com o Beco do Rato, que ele ouvira falar e queria conhecer. Teve tempo apenas de dar uma golfada diante do lixo que encontrou, com gente esquisita e "underground", e suplicou por um outro boteco.

Como o Chico, este é nome dele, ficou tão nervoso com o que viu, pediu um bar com urgência. A primeira coisa que pensei foi tirá-lo do infeliz burburinho daquele lugar, e o levei em direção a Gloria. Fomos, por sorte divina, parar diante de uma das mais antigas casas de saliência da cidade, a termas Rio Antigo. Perguntou-me se era um hotel, pois achou a arquitetura muito bonita e imponente, mas não precisou de muito tempo para notar que o ramo comercial ali era outro. Por causa de sua curiosidade exagerada com o lugar, acabamos entrando no bar localizado exatamente defronte à casa das primas, na esquina de Joaquim Silva com Augusto Severo. Chamam o local de bar Glorioso, mas não vi nenhuma placa no mesmo.

O lugar era escuro, sujo e escroto. Eu, que devo ser o cara que mais adoro estes balcões radicais, cheguei a torcer o nariz quando entrei. Mas é o que falo sempre, foi só começar a pedir as bebidas e comidas para ter a certeza de como sou feliz quando piso nos meus botecos. A cerveja chegou na minha frente fumegando mais do que a bomba atômica, de rachar os dentes. Os ovos que pedimos estavam fresquinhos, saudáveis, bons para caralho. E arrematamos com uma porção de fígado acebolado que nem minha vó faz igual. Nesta altura do campeonato o Chico já bradava na calçada atacando o tal do beco do rato com xingamentos que não posso escrever aqui. Delirava naquele canto imundo, doido para entrar no tal "hotel" e ver as meninas.






Os atendentes do pé-sujo eram mudos, somente colocavam os pedidos diante de nós. Anônimos diversos tentavam a sorte na jogatina. Do lado de fora, além de nós estava um coroão que mais parecia um desenho animado. O cara tinha uma juba estilo "black", daquelas que o João Saldanha reprovaria na certa, e estava mais imundo do que a cozinha do Belmonte. Trata-se de um mecânico da área, que vive por ali no intuito de ver as damas entrando e saindo do trabalho no "hotel". O cara é um negão de cabelo branco, e seu nome é Xavante. É complicado pessoal, mas é isso.

O cidadão estava meio na dele, fumando seu cigarrinho, mas depois de umas doses de São João da Barra e copos de cerveja já dançava Maicou Jéquison na calçada, para o aplauso dos que passavam e estavam ali. Convidou-nos para um churrasco que faz toda a semana, e disse que já comeu todo mundo dentro do "hotel", afirmando já ter até perdido a graça entrar ali. Foi um furdunço geral.







Eu sei o seguinte... A pouquíssimos metros dali, no calçadão da Glória, outras meninas desfilam pomposas e posudas, guardando no interior de suas vestes minúsculas dotes um pouco diferentes. Espero que nosso dançarino "black power' não tenha confundido o cardápio.

Salve o bar, salve o bar!

14 comentários:

Matheus Trunk disse...

Felipinho, teu blog é genial. Já está adicionado nos meus preferidos. Tua crônica a "Noite do Seu Nestor" é extraordinária, digna do melhor de escritores como Stanislaw Ponte Preta. Genial mesmo.

Matheus Trunk
www.violaosardinhaepao.blogspot.com

ipaco disse...

Sensacional, Felipinho, sensacional!

Salve! salve! salve!

Diego Moreira disse...

Eis uma riquíssima experiência antropológica. Do caralho, meu velho. Abraço!

Eduardo Goldenberg disse...

Pois se Matheus Truunk - que NUNCA leu o Stanislaw, isso fica evidente diante do comentário - , Ipaco e Diego gostaram, eu detestei e agudamente.

"O lugar era escuro, sujo e escroto. Eu, que devo ser o cara que mais adoro estes balcões radicais, cheguei a torcer o nariz quando entrei" é de um mau gosto horripilante, tétrico, nojento, até.

Como gostar de um lugar escuro, sujo e escroto?! Francamente. Eis aí o radicalismo do PSOL aplicado ao suposto bem-querer dos botequins mais vagabundos.

Como diria Leonel de Moura Brizola, francamente.

De todo lamentável.

Felipinho disse...

Este comentário foi removido pelo autor.

Eduardo Goldenberg disse...

Foi uma piada, Pipo Espanhol, uma piada. Lugar escuro, sujo e escroto me parece definir briôco de prostituta em fim de carreira. Radical, como o PSOL.

Eduardo Goldenberg disse...

Hum, removeu.

andarilho disse...

Realmente foi uma noite gloriosa...me fez lembrar Allen Ginsberg.E os rios do inferno-leste, sanduíches indigestos trotando
um ranger de pontes, carrinhos de bebê encalhados, esquecidos
pneus de bojo negro careca, penicos
e camisas-de-vênus, o poema da margem, canivetes, nada inox, só o mofo...
o lixo de tantas coisas cortantes cujo fio passava
para o passado... Parabens Felipinho pelo blog e obrigado pela noitada! salve,salve!

Ricardo Lopes disse...

Como fala meu tio: Sensacional.
Este dia realmente foi sensacional. E este pé-sujo também é sensacional.

Matheus Trunk disse...

Eduardo, respeito suas opiniões e acho legal o seu blog. Realmente não entendi seu objetivo em falar que eu nunca li o Stanislaw dessa maneira. Sinceramente cara, você nem me conhece e já vem chutando balde assim. Poxa, parece até que você é uma espécie de "intocável" da internet ou coisa assim. Sei que você é uma pessoa talentosa e inteligente. Deixe disso cara. Ninguém é melhor que ninguém cara.

Matheus Trunk(e não Truunk)
www.violaosardinhaepao.blogpsot.com

Vv disse...

O relato está bárbaro ... :) E eu que moro na Cândido Mendes, bem ali no "baixo Santa, Alto Glória", vislumbrei as "meninas" que desfilam por lá ...rs. Abraços, Vivi.

Szegeri disse...

Velho Galo, interpretei as palavras do Pequeno-grande Homem diferentemente de você. Aliás, em sentido diametralmente oposto. Ele não diz que gostou do bar porque "o lugar era escuro, sujo e escroto", o que seria um evidente contra-senso. Fica patente na seqüência: Eu, que devo ser o cara que mais adoro estes balcões radicais [leia-se: radicais na simplicidade, na falta de "atrativos" outros, na pouca preocupação com os modismos estéticos, etc.], cheguei a torcer o nariz quando entrei. Mas é o que falo sempre, foi só começar a pedir as bebidas e comidas para ter a certeza de como sou feliz quando piso nos meus botecos.
Vale dizer: o nosso homem de Espanha não gostou do bar logo de cara. Mas somente no correr da noite, a despeito do "lugar... escuro, sujo e escroto". E isto deu-se, à evidência, porque o ambiente, o clima, a fluência das relações que só se travam nos verdadeiros butecos terem uma importância muito maior do que os refinamentos, as decorações, os salamaleques todos. Exatamente como todos nós temos defendido nestes anos todos. Bola preta para o Edu!

Eduardo Goldenberg disse...

Uma única verdade emerge de vosso texto, nobre Szegeri: "(...) nosso homem de Espanha (...)". Maravilha.

Anonymous disse...

Quem é o "hair stylist" do crioulo?

abraço

Coelho