sábado, 19 de janeiro de 2013
DE VOLTA, E COM O ARMAZÉM.
quinta-feira, 31 de maio de 2007
ARMAZÉM SENADO - 100 ANOS

- É muito bom debruçar os cotovelos no larguíssimo balcão de mármore enquanto se aprecia os velhos sobrados da área.
- Ficar olhando o velho Antônio, dono, do tempo do lá vai fumaça, pai de Henrique e Fernando, manusear os produtos do Armazém que são vendidos à granel só para o dia passar...
- Brincar com o eterno gato da casa, o bichano pede logo carinho quando você levanta o dedo por uma gelada.
- Conversar com os fregueses do bar também centenários. Saldanha, seu Orlando, tia Cida, tia Joana, o velho cantor. É cada causo de dar inveja do passado que não vivi.
- Ficar bebendo e olhando para os produtos que estão à venda e expostos naquelas imensas prateleiras: sandálias havaianas, caixas de maizena, potes de aveia, lustra móveis, um lustrador de pratas das antigas, latas de salsicha, macarrão, farinha, achocolatado Behring (o da caixa amarela), cachaça pra cacete, e várias outras miudezas que fogem-me da memória no momento. Ah, e sobre a porta do banheiro feminino repousa pendurado um serrote?!? Deve ser alguma mandinga...
- Se por acaso o lugar estiver cheio, ou se estiver vazio também, você pode ficar do lado dentro do balcão, sentado ou em pé.
- De comer não há variedade, praticamente frios, azeitonas de saquinho e tremoços. Delícia! Mas, se quiseres pode levar comida de casa, entrar na cozinha e fazer seu tira gosto sem problemas.
- Outra coisa importante é que o seu Antônio é América, tem até um relógio de parede em cima da porta da despensa.
- Todo o primeiro sábado do mês o Fernando coloca uma vitrola para que os fregueses levem seus discos e apreciem suas canções favoritas do passado.
Dando uma pausa nesta listagem aproveito para ressaltar este último item. Muitos sabem que coleciono lps, e por isso sempre estou neste sábado no Armazém. Quando eu chego com minha bolsa de vinis os coroas hurram de alegria. É um imenso benefício para o meu interior fazer com que aquelas pessoas se relembrem das velhas canções, teve gente que já pediu para que eu parasse pois era muito para seu coração. É Cartola, Vinicius, Altemar Dutra, Dolores, Dalva, Noel, Jamela, Nelson Gonçalves (com este o pessoal pira), Moreira da Silva, Anísio Silva, Nelson Cavaquinho, Baden, Paulinho da Viola, Geraldo Pereira... E por aí vai.

- Vocês estão me fazendo lembrar da felicidade por um instante...
Bicho, deu aquele nó na garganta, foi foda. Mas ao mesmo tempo pensei comigo que é por isso que estes lugares existem, para unir pessoas que precisam de outras, gerando assim este sentimento de afeto que está cada vez mais raro, porém sempre encontrado nos verdadeiros botequins. Parte dessa nossa cultura que estão querendo acabar... Coisa da "canalha" como diz o Edu.
Quando a voz de Jamelão bradou pelas humildes caixas de som do local, seu Abreu deu um pulo surpreso e voltou-me com mais palavras:
- Assim já é demais, faz tempo que não ouço Jamelão, já toquei pandeiro com ele em décadas passadas, adoro sua voz.
Em seguida pegou seu telefone para uma ligação, ele simplesmente cancelou o almoço com a irmã e pediu uma porção de mortadela para o Henrique, e ainda dividiu com os novos companheiros. É ou não é único este momento?

Será um momento de resistência para nossa cidade cada vez mais abandonada, assim que souber a data precisa estarei informando. Quem puder apareça por lá.
Abraço.
domingo, 4 de março de 2007
ARMAZÉM SENADO
Passei lá neste sábado com minha senhora (Heloisa), minha irmã (Nathalia) e meu cunhado e irmão (André), os camaradas já estavam presentes e quando cheguei o Mendonça foi logo me dizendo onde estavam os discos:
- Fala Felipe, comprei esta caixa com uns 100 vinis. Fica à vontade e bota pra quebrar.
E assim vai. Com uma Brahma sempre gelada no copo, estava conversando com a Helô e a Nath quando veio até a minha pessoa um senhor que estava bebendo no balcão ao nosso lado:
- Você gosta de música?
- Sim, gosto.
- Eu toco violão há 40 anos, sou solista. Mas minha profissão é engenheiro de tubulações e civil. Estou aqui com a minha viola de 1962. Quer ver?
O cara era a maior figura, o violão dele era realmente antigo e bem cuidado. Ele ficou me explicando coisas de música, sustenido, notas... E até deu uma palhinha pra nós. É aquele tipo de cara que parece que tá na merda por que a família o largou, ou vice-versa. Depois de muita conversa, seu Oscar, que pediu para o chamássemos só de Oscar, nos contou que mora "sozinho" na Gomes Freire porque tinha se divorciado da mulher, mas que de vez em quando vê os netos. E por umas quatro ou cinco vezes, já depois de tomar algumas, falou com ar de saudades que ainda gostava de sua ex-esposa. Demos tanta atenção pro cara que ele falou que estava muito feliz de estar conosco e me deu um cartãozinho da firma dele para ligarmos no caso de querermos aprender violão. Coroa gente fina, um bom exemplo de boemia e nostalgia.

Oscar, eu e André
Quando ele foi embora me juntei ao André, que conversava com o Ronaldo, um companheiro de copo. Falávamos de como o mundo de hoje está perdido e a conversa foi boa porque o cara é radical que nem eu, acreditando que não existe tempo como o de antes. O André falou rindo pra caramba:
- Pô Felipe pensei que só você era assim meio radical, mas tô vendo que tem mais gente...
E Ronaldo nos contando como conheceu Nelson Cavaquinho, Monarco, Nelson Sargento, e outros da velha guarda. Convidou-nos para irmos um dia na Mangueira conhecer o pessoal. O Nelson Cavaquinho ele diz que conheceu num bordel quando era novo, e que sua avó que lhe deu o dinheiro para conhecer os prazeres da vida. Outra figura, outro gente fina.
Nessa altura do campeonato Heloisa e Nathalia tinham ido dar uma passada na feira do rio antigo que tem todo mês na rua do Lavradio, um pouco depois resolvi dar olhada também e procurá-las. O André ficou conversando com o Ronaldo. A feira estava cheia, várias barracas com coisas antigas bem legais, incluindo muitos vinis. Tinham dois grupos de música se apresentado na feira, um de tango e outro de choro, este último com a filha do saudoso Rafael Rebelo no cavaquinho. Andava por ali até me deparar diante do velho cortiço da rua do Lavradio, primeiro endereço da minha família espanhola no Brasil na década de 50. A fachada é muito bonita, mas está degradada pelo tempo e por um incêndio que há dois anos danificou mais ainda o lugar. E como os filhos da puta que governam o país cagam pra tudo o que é história, não tenho muitas esperanças de que vai ser reformado. Entrei no cortiço, ainda há pessoas morando ali, tirei várias fotos e depois fiquei olhando o local, me deu a maior emoção, confesso que cheguei a chorar. Saí dali e encontrei as duas que perceberam que estava com olhos vermelhos e eu contei o motivo.

Helô e Nath

Fachada do Cortiço
Fomos embora e andamos juntos até a rua do Lavradio. André me chamou atenção para um senhor encostado do lado de fora de um bar, ele parecia ser de outra época. Perguntei-lhe seu nome e logo depois se poderia tirar uma foto dele:
- Meu nome é Lepoldo. Pode tirar a foto, mas deixa eu largar o copo senão vou pensar que sou cachaceiro.
Eu disse que não tinha problema, só não tinha como sair dali sem uma foto dele. vejam a figura logo abaixo, o que acham?

Leopoldo

Eu e seu Aires